sábado, 7 de abril de 2018

Ciência X Ficção: O problema da viagem no tempo


Em Back to the Future (De Volta para o Futuro, BR / Regresso ao Futuro, PT), a dupla Marty McFly e Doc Brown encaram alguns desafios e armadilhas paradoxais em suas viagens pelo tempo.

John Gribbin (astrofísico britânico, escreve para a revista BBC Focus Magazine sobre astronomia, astrofísica e ciência em geral) explica "a ciência por trás da viagem do tempo" nos filmes e se "viajar através do tempo é mesmo possível".

"Estamos descendo numa Hill Valley, Califórnia, às 4:29 da tarde. É uma quarta-feira, 21 de Outubro, ano 2015!" - Doc Brown



© Maite Franchi/BBC Focus magazine

O Paradoxo do Avó
1º problema na Teoria sobre Viagem no Tempo

Um viajante no tempo volta no tempo e acidentalmente ou deliberadamente (se você estiver de mau humor, talvez) mata seu próprio avó, antes que o pai do viajante do tempo tenha sido concebido. Então, o viajante do tempo nunca nasceu, tão pouco ele nunca voltou no tempo e por consequência seu avó nunca morreu. Neste caso, então, o viajante do tempo... nasceu... e assim por diante. Percebe?! Isto é um paradoxo.

Um paradoxo é uma declaração aparentemente verdadeira que leva a uma contradição lógica, ou a uma situação que contradiz a intuição comum. Em termos simples, um paradoxo é "o oposto do que alguém pensa ser a verdade".

Normalmente temos uma causa e depois um efeito, por exemplo: você bate o joelho na quina da cama - isto é a causa. Você chora de dor por causa disso - isto é o efeito. Você nunca vai poder chorar de dor sem antes ter batido o joelho na quina da cama, ou seja, o efeito nunca vem antes da causa! Isto é a lógica correta a ser seguida, certo? Pois num paradoxo é o exato oposto que "acontece", no nosso caso, quando existe uma mudança de causa-efeito se tornando efeito-causa, isto é, o futuro influenciando acontecimentos do passado e o passado influenciando acontecimentos no futuro, algo ilógico quando paramos pra pensar desta forma.

Pois então isto (descrito acima) é um paradoxo (e existe uma grande lista deles) e o paradoxo do avó é, talvez, o pior deles (claro, isto considerando para qualquer viajante no tempo).

Este paradoxo foi creditado pela primeira vez por Nathaniel Schachner em 1933.

Como é nos filmes?

Se o jovem Marty McFly acidentalmente interrompe que seus próprios pais se apaixonem e se casem, então ele nunca vai existir! Mas, conforme o escritor de ficção Robert Heinlein bem colocou, "um paradoxo pode ser paradoutorado". Marty altera o seu passado, mas de um modo positivo. Ele chega em uma casa diferente do que havia deixado, acabou em um futuro melhor do que ele havia deixado no passado (mãe saudável, pai bem sucedido e escritor de livros, dois carrões na garagem) ou seja, o presente (agora passado) em que ele vivia anteriormente (mãe bêbada, tio preso, pai submisso, carro amassado) foi alterado para um presente (agora futuro) melhor.


Seria isto possível?

Uma ideia que é amada pelos escritores de ficção científica, com base em dados e fatos científicos, é que toda possibilidade de realidade coexistem lado a lado. Estes "muitos mundos" - também podendo ser chamado de multiverso, universo paralelo, Terra paralela, realidade paralela, mundos paralelos, etc - são como um galho de uma árvore, na qual cada um é uma versão da história. Se você for de volta no tempo, no tronco da árvore, e depois avançar pra frente no tempo novamente, você possivelmente estará "de volta" em um galho diferente daquele que você desceu (ou daquele que você saiu). Você regressa no tempo e interrompe de seus pais se conhecerem, então avança de volta para o futuro no galho na qual eles nunca se conheceram e... você nunca nasceu!

No entanto isto seria uma linha do tempo na qual o viajantes do tempo já tivesse sumido, isto é, nunca retornou (igual acontece na história original escrita por H.G. Wells em 1895, A Máquina do Tempo - The Time Machine) e uma outra (linha do tempo) com uma pessoa que não tem pais!
Parece complicado, mas não paradoxal!

© Maite Franchi/BBC Focus magazine

O Paradoxo de Bootstrap
2º problema na Teoria sobre Viagem no Tempo

O termo em inglês bootstrap significa uma expressão de obter (alguma coisa ou a própria coisa - ela mesma) dentro ou fora de uma situação usando os próprios recursos existentes (desta coisa ou alguma coisa - ela mesma). Em outras palavras, é uma coisa (um item ou um trecho de informação) que é enviado do futuro para o passado, se tornando o mesmo item que foi entregue do passado para o futuro.


Aqui fica claro que a situação é mais "complexa" que uma circunstância de causa-efeito, pois num bootstrap o que causa a causa é o efeito e o efeito é causado por causa da causa!

Vou fazer um rápido parênteses aqui: temos uma versão criada por fãs da trilogia chamado BACK TO THE FUTURE: BOOTSTRAP EDITION, onde o filme foi editado de forma cronológica, ou seja, começa lá em 1885, vai para 1955 e finalmente em 1985, só no final deste filme - que tem mais de 3 horas de duração pois junta tudo num novo corte de edição - que eles vão parar em 2015, aí termina assim. E ainda está DUBLADO usando a dublagem clássica dos Estúdios da BKS! Agora ficou interessado em assistir?! Clique aqui e procure pelo link para download (e não se esqueça de ler as informações de copyright e disclaimer).

Como é nos filmes?

Na cena do baile em 1955, Marty McFly, vai até ao palco e canta uma música "antiga de onde ele vem", a famosa Johnny B. Goode de Chuck Berry. O primo (fictício) de Chuck, Marvin Berry, estava lá no baile e imediatamente pega o telefone e liga para ele pedindo para "escutar isso", já que Chuck estava "procurando um novo som". Inspirado pelo som que ouviu, Chuck então lança a música em 1958 e Marty poderia então ouvi-la no futuro... Mas e agora? Quem escreveu a música?!


De onde veio essa ideia?

Esta teoria foi popularizada por Robert A. Heinlein em 1941 numa história curta chamada "By His Bootstrap" (daí o nome do paradoxo), onde um caderno de anotações é encontrado pelo personagem principal num futuro distante. Ele pegou o caderno e então viajou para um ponto anterior do futuro de onde estava e aproveitou das informações traduzidas deste caderno para ajudá-lo a estabelecer (à ele mesmo) como um tipo de ditador benevolente. Quando o caderninho ficou velho e desgastado, com várias orelhas entre as páginas, ele copiou a informação num novo caderno e descartou o original. No final do romance, ele pensa que nunca existiram dois cadernos - ele acha que o livro mais novo é o que ele achou por ele mesmo quando ele chegou... Sim, é de dar no cérebro!


© Maite Franchi/BBC Focus magazine

O Paradoxo de Polchinski
3º problema na Teoria sobre Viagem no Tempo

Se uma bola de bilhar (sinuca ou snooker) rolar para dentro de um buraco de minhoca numa velocidade certa e num ângulo certo, isso fará com que ela apareça na outra ponta no exato momento do seu "outro eu" começar a entrar no buraco de minhoca!

Este paradoxo foi proposto pela primeira vez por Joseph Polchinski em 1990.

Seria isto possível?

Esta é uma teoria que é levada muito a sério no meio acadêmico dos cientistas e já foi discutida em artigos de pesquisas publicados em jornais e periódicos de renome. O interesse deles é instigado pelo fato que não há nada na Teoria da Relatividade Geral (leia mais a frente sobre) que proíba a viagem no tempo, e a curva temporal fechada (sigla em inglês p/ CTC: Closed Timelike Curve, por exemplo, um buraco de minhoca), ou um caminho através do espaço-tempo que termina onde começou (me fez lembrar do símbolo oroboro ou ouroboros - aquele da serpente comendo o próprio rabo), no mesmo ponto do espaço-tempo, onde são permitidos.


Mas esta é a história toda?

Não exatamente, existe também as curvas temporais fechadas auto-consistentes. Se a bola de bilhar está se aproximando da boca do túnel, sua contraparte mais velha pode surgir da segunda boca e dar a contraparte mais jovem um golpe fulminante exatamente no ponto para enviá-la através do buraco de minhoca, do mesmo modo que fará surgir do outro lado e entregá-la o mesmo golpe fulminante da mesma maneira. Existem muitas possibilidades consistentes deste tipo de trajetória... No caso mais extremo, a "segunda bola de bilhar" pode surgir do túnel e se choca com a "primeira bola" completamente do nada, mas, por sua vez, é desviado para o buraco de minhoca, onde toma o lugar da "primeira bola".

Um bocado de cálculos cabeludos nos mostram que não existe um sistema igual a este onde não possuem trajetórias auto-consistentes e que, em alguns casos, podem existir um número infinito de soluções auto-consistentes para estas equações.

Tudo isso contribui para a conjectura do físico russo Igor Novikov, algumas vezes grandiosamente referida como O Princípio Auto-Consistente de Novikov, no qual se estabelece que a viagem no tempo é permitida, mas paradoxos são proibidos! Isto poderia resolver o Paradoxo do Avó (leia mais acima sobre) - se você voltar e tentar matar seu avó, alguma coisa irá acontecer e sempre dará errado. Pegue uma arma para atirar nele e a bala irá falhar; envenene o vinho e alguma outra pessoa irá beber o drinque no lugar do seu avó... e assim por diante.


© Maite Franchi/BBC Focus magazine

O Paradoxo dos Gêmeos
4º problema na Teoria sobre Viagem no Tempo

Se apenas um pessoa de um par de gêmeos decidir ir à uma jornada, viajando apenas numa fração da velocidade da luz, ele (ou ela) irá envelhecer mais vagarosamente (devagar) do que seu outro irmão gêmeo que ficou em casa. E quando o irmão viajante retornar, ele (ou ela) estará mais jovem do que o gêmeo que ficou em casa. Literalmente mais jovem, em todos os termos biológicos. Por exemplo; teríamos um gêmeo com 70 anos (o que ficou em casa, chamado de "Adan") e outro com 50 anos (que viajou na nave espacial, chamado de "Luno").


Como é nos filmes?

No filme de 1968 O Planeta dos Macacos (Planet of the Apes), o astronauta George Taylor (interpretado por Charlton Heston), e sua tripulação ficaram 18 meses (1 ano e 6 meses) em hibernação, próximos à velocidade da luz, antes de aterrizar de volta na Terra (por volta de 200 anos no futuro).

Poderíamos citar também o que aconteceu aos tripulantes da nave Endurance do filme Interestelar (dirigido por Christopher Nolan, filme lançado em 2014), porém o que acontece nesse filme, a situação, é um pouco diferente (do ponto de vista científico) do que estamos falando aqui sobre este paradoxo dos gêmeos. Explicando: eles foram à uma viagem interestelar e alguns dos tripulantes precisaram entrar num buraco de minhoca para recuperar dados deixados em um planeta (não vou detalhar muito para não estragar a surpresa de quem não viu o filme) e quando estes tripulantes retornam à nave perceberam que já haviam se passado 23 anos (todos os outros colegas estavam jovens e apenas os que retornaram estavam mais velhos).

Seria isto possível?

Esta é a mais científica e menos paradoxal de todas as teorias sobre viagens no tempo. A Teoria Especial da Relatividade (ou Teoria da Relatividade Restrita) nos diz que relógios podem se mover lentamente (isto incluindo também o relógio interno biológico).

Mais um rápido parênteses aqui: Albert Einstein postulou duas teorias da relatividade: a Especial (chamada também de Restrita) - publicada em 1905 e a Teoria Geral da Relatividade - publicada em 1915! Qual a diferença entre ambas?
• A "Teoria Restrita/Especial" NÃO considera os campos gravitacionais e a influência da aceleração gravitacional, somente considera as referências inerciais, ou seja, as leis da inércia de Isaac Newton são válidas aqui.

• A "Teoria Geral" considera SIM tudo relacionado à força da gravidade. Ela lida com a questão da dilatação do tempo, ondas gravitacionais, lentes gravitacionais, curvatura do espaço-tempo, buracos negros e até pode ser conciliada com as leis da física quântica. Se aplica a referenciais não-inerciais, ou seja, a referencias que podem sofrer uma aceleração gravitacional.

Relógios se movendo mais lentamente foi testado em aceleradores de partículas como o Grande Colisor de Hádrons (sigla em inglês para LHC - Large Hadron Collider). Partículas com um tempo de vida conhecido, quando estacionárias no laboratório, "sobrevivem" mais tempo quando estão se movimentando perto da velocidade da luz.


Só que, espera um pouco aí...

A Teoria Especial da Relatividade prediz que todos os observadores são equivalentes, não seria isso? Por que o irmão gêmeo viajante não poderia dizer que está descansando, enquanto a Terra e o outro irmão gêmeo viajam para o futuro? Todos os observadores inertes, aqueles que em linhas retas estão em velocidade constante em relação um ao outro, são equivalentes. A aceleração muda as regras do jogo e, para chegar em casa, o viajante precisa desacelerar e depois acelerar de volta na direção oposta.

Neste exemplo hipotético usado frequentemente pelos paradoxoradores, estas gambiarras acontecem instantaneamente. O cosmologista Hermann Bondi diz que "se você entregar a cada gêmeo uma caixa cheia de ovos para eles segurarem, no final da jornada você vai encontrar o viajante coberto de ovos espalhados para todos os lados, enquanto o gêmeo que ficou em casa paradinho está todo limpo". Eles não são tão equivalentes assim. Tudo isso pode ser descrito precisamente utilizando equações e o resultado será sempre o mesmo.

Este tipo de viagem no tempo é ciência pura... e funciona e como funciona!

Pra finalizar: ao menos que você encontre um buraco de minhoca, não temos chance nenhuma de conseguir ir de volta para o futuro... Ops, esta é uma grande ideia para um título de filme, hehehe.


Fonte: Science Focus

2 comentários:

  1. Pois é viagem no tempo sempre vai ser um papo especulativo, não existe essa de certo ou errado. Mas eu discordo da sua visão. Esse seu paradoxo é apenas uma interpretação, existem muitas teorias sobre viagem no tempo em que isso não gera paradoxo nenhum, justamente porque a viagem em si ja faz o viajante ir pra uma linha paralela, ou seja mesmo viajando pro passado voce jamais altera a realidade que deixou, porque viajou pra uma diferente. Vale a pena pesquisar sobre isso, existem muitas visões interessantes sobre viagem no tempo.

    Sobre o Chuck Berry essas teorias encaixam muito bem, porque o fato do Marty voltar pro passado e alterar a criação da musica nao entra em conflito com a realidade que ele conhece, apenas cria uma diferente....a minha visao é o que o filme nao segue estritamente nenhuma dessas teorias, ele cria um mix, tem um pouco de cada....essa viagem pro futuro ja deixa isso claro....porque se ele volta pro passado e volta teoricamente na mesma linha temporal, porque a viagem pro futuro nao seria na mesma linha temporal? Nao faz sentido, mas enfim a gente perdoa em nome do roteiro do filme...

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    1. Então, realmente é tudo muito especulativo e eu conheço as diversas interpretações de viagens no tempo que existem por aí. Fique de olho no blog, sempre. São poucas as vezes que leitores comentam em nossos artigos e posts aqui. Este debate rende muito, mesmo! E por exemplo esta história das linhas do tempo no filme, desde que entrei na equipe do Blog BTTF estou preparando um super artigo explicando DETALHADAMENTE cada mudança da linha do tempo. Então, nos vemos no futuro (se nenhum paradoxo interferir antes, hahaha).

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